segunda-feira, 28 de abril de 2008

DESENVOLVIMENTO DE ÁFRICA PASSA POR JAPÃO

Ministros africanos preparam a cimeira da TICAD IV

Paulo Julião, em Libreville*

Cinquenta ministros do continente africanos estão a preparar , aqui em Libreville-Gabão, a quarta Conferência Internacional de Tóquio para o Desenvolvimento de África, também conhecida por TICAD IV, a ter lugar entre os dias 28 e 30 de maio na cidade de Yokohama-Japão e, cujo objectivo será analisar as questões ligadas ao desenvolvimento económico e social dos países africanos e a ajuda que o governo nipónico pode prestar a esse respeito.
Angola esta a participar na reunião que hoje, sexta-feira conhece o seu fim, com uma delegação chefiada pela ministra do Planeamento, Ana Dias Lourenço e que integra os embaixadores do nosso países no Japão, Albino Malungo, no Gabão Emílio Guerra, e Joaquim de Lemos, director para Ásia e Oceânia do Ministério das Relações Exteriores e coordenador nacional do para a TICAD IV .
A reunião ministerial, preparatória, da cimeira da TICAD IV debruçou-se fundamentalmente sobre a declaração a ser adoptada em Yokohama, e que deverá em termos gerais contemplar as questões ligadas ao desenvolvimento económico sustentável em África, como são o crescimento económico, segurança humana, consolidação da paz e democratização, Meio ambiente-mudanças climáticas e por fim a cooperação Ásia/África e outros.
A quarta Conferência Internacional de Tóquio para o Desenvolvimento de África, TICAD IV deverá, também, conceder financiamentos a países africanos , dando prioridades às acções que visam a redução da pobreza e exclusão social, tais como comércio, investimento, desenvolvimento de infra-estrutura e agricultura e, igualmente apoio aos projectos no âmbito da NEPAD.
Quanto a segurança social, o compromisso da TICAD IV consistirá na garantia da assistência técnica e financeira aos países africanos para atingir as metas dos objectivos de desenvolvimento do milénio, incluindo a consolidação da paz e o incremento do apoio a democratização dos países africanos.
No domínio da consolidação da Paz e Democratização, o quadro estratégico da cooperação entre o Japão e os países africanos no âmbito da TICAD IV vai inclinar-se no apoio as Instituições, programas e processos dedicados ao controlo de armas ligeiras e de pequeno porte, projecto de formação na área de resolução de conflitos e na reconstrução de países destruídos pelos conflitos armados.
Uma outra aposta da TICAD IV será o desenvolvimento dos recursos humanos e o reforço institucional nas áreas da governação dos países do nosso continente e encorajar os doadores a concederem financiamentos para a preparação e disseminação das melhores práticas resultantes da avaliação de pares.
Os japoneses estão preocupados com alterações climáticas que se registam em todo mundo e, vão aproveitar a cimeira da TICAD IV, para abordar com os seus parceiros africanos este grande desafio que se coloca sobre a humanidade e elaborarem estratégias referentes as questões ambientais e assistência técnica visando adoptar mecanismos para vencer os obstáculos ao progresso e crescimento sustentável dos países africanos, nos sectores de energia, água e calamidades naturais.
Este último ponto foi de resto, o que representou maior preocupação por parte dos ministros africanos que desejam estudar com o seu parceiro, Japão, o financiamentos de projectos específicos de combate a desertificação, cheias e a irradicação de algumas doenças, como a poliomielite.
Os africanos desejam que a relação com Tóquio seja feita numa base transversal, pois tem havido quase que uma imposição dos doadores para que os países que recebem ajudas satisfaçam, exclusivamente, as exigências de quem empresta ou doa o dinheiro, sem se ter em contas as prioridades estratégicas do parceiro.
A Conferência Internacional de Tóquio para o Desenvolvimento de África, TICAD é realizada de cinco em cinco anos e foi criada em 1993 por iniciativa do governo japonês e visa ajudar os países africanos a desenvolverem as suas economias.
Quanto a parceria alargada, a declaração a ser aprovada no próximo de Maio, Yokohama-Japão, poderá sublinhar a importância da cooperação Ásia/África, incluindo a promoção do investimentos nos dois continentes.
No último dia da reunião, os países do magrebe, Argélia, Egipto e Marroco introduziram um elemento novo na abordagem da cooperação entre o Japão e África. Os três países dizem valerem-se das suas experiências para servirem de intermediários na discussão directa dos projectos que os restantes países africanos deverão submeter ao financiamento nipónico. Uma proposta que não colheu nenhuma simpatia dos presentes aqui em Libreville.
No que a Angola diz respeito, a cooperação económica com o país do “sol nascente” tem incidido em duas áreas, nomeadamente, a Ajuda Pública ao Desenvolvimento que se subdivide em: cooperação não reembolsável, a cooperação técnica e a cooperação comercial/empresarial.
O governo angolano já submeteu ao Japão, nesses 17 anos de cooperação, de 1990 a 2007, vários projectos para financiamento no quadro da ajuda não reembolsável, nos domínios da saúde, educação, reinserção social, obras públicas, agricultura , telecomunicações, transportes e Energia e Águas. 35 desses projectos receberam a luz verde dos japoneses que para isso desembolsou ate ao momento 300 milhões de dólares americanos para construção e reabilitação de várias infra-estruturas de impacto social, com destaque para a reconstrução e reequipamento do Hospital Josina Machel em Luanda, apetrechamento da Maternidade Lucrecia Paim, melhoramento de equipamento médico em algumas unidades dos cuidados primários na capital do país, construção de escola em vários municípios também de Luanda, entre outros projectos.
Ainda no quadro da ajuda não reembolsável, o sector dos transportes do nosso país vai beneficiar-se, nos próximos tempos, com trinta milhões de dólares americanos para cobrir programas de reabilitação de emergência dos Portos comerciais do Lobito e do Namibe. A assinatura do referido acordo de financiamento está prevista para o presente ano.
No domínio técnico Japão quer emprestar a Angola do melhor que tem, oferecendo formações em mestrados e doutoramentos de diferentes especialidades. Ainda no âmbito da ciência e tecnologia, os japoneses vão criar em Angola um laboratório de biotecnologia especializado em microbiologia e genética, deverão igualmente montar uma unidade de pesquisa e fabrico no domínio da energia solar, a massificação do uso de tecnologias de informação e comunicação e construção de parques tecnológicos em Luanda, Huambo, Cabinda e Benguela.
Refira-se que mesmo com esse elevado volume de negócios, Angola e Japão ainda não rubricaram o acordo geral de cooperação.

* Jornalista da RNA.

domingo, 30 de dezembro de 2007

REVISTA DO ANO 2007

Despediu-se 2007 e com ele a retrospectiva dos acontecimentos que marcaram o ano nos domínios político, Económico, social e desportivo.
O ano que dentro de algumas horas termina foi significativo para os angolanos. Foi o ano do Afrobasquete, onde mais uma vez a África e o mundo renderam-se aos encantos de Angola. A realização deste um evento que testou a capacidade organizativa das autoridades desportivas de Angola, 2007 foi o ano da vitória desportiva, o andebol feminino fechou com os holofotes do mundo virados para o nosso país.
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Angola vestiu-se de gala e acolheu de 15 a 25 de Agosto e de forma superior mais um evento desportivo continental que enriquece sem sombras de dúvida a história do nosso país.
Foram 16 selecções nacionais, que constituem a "nata" do basquetebol do continente, que conheceram uma Angola imersa na unidade, na paz e na senda da reconstrução nacional.
Os nossos visitantes descobriram uma Angola decididamente lançada para o futuro com uma das economias mais promissoras do mundo a crescer, a um ritmo médio anual de 13%.
Tomaram contacto com o "grande desafio do governo de transformar o crescimento económico em desenvolvimento, cujos benefícios se reflictam na melhoria das condições de vida das populações".
A “nata” do basketebol africano que se reuniu no nosso país testemunhou uma aposta ganha pelo governo angolano, que em tempo record construiu de raiz quatro pavilhões nas províncias de Benguela, Cabinda, Huíla e Huambo em Luanda a, totalmente remodelada Cidadela, assim como outras obras sociais erguidas e modernizadas, dando assim, uma prova inequívoca de que Angola está na senda do progresso e os angolanos acreditam no futuro.
Os nossos hóspedes renderam-se ao elevado nível de organização do campeonato que corou pela nona vez a nossa selecção como a campeã e líder indiscutível do basketebol sénior masculino no continente berço da humanidade.
Luanda, Cabinda e Huambo foram mais uma vez palco da elite do basquete continental desta feita em clubes campeões.
O Basquete angolano traçou o seu caminho em 2007. Jogos Olímpicos de Pequim.
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Recuamos nos últimos doze meses com a intensa actividade presidencial marcada pelas deslocações pelo país, por África, Europa e Médio Oriente.
No Plano interno a auscultação aos líderes dos principais partidos políticos representados em Conselho da Republica e procedeu a inauguração de vários empreendimentos com vista a melhoria dos serviços básicos da população.


2007, foi um ano marcado por uma actuação mais activa da Assembleia Nacional que aprovou mais de vinte diplomas e perto de cinquenta resoluções.
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O registo eleitoral em Angola, que confere o direito de votar a mais de oito milhões de cidadãos, foi uma das grandes tarefas executada pelo Governo, através da Comissão Interministerial para o Processo Eleitoral (CIPE), no ano que termina dentro de horas.Oito milhões, noventa e um mil, e centro e três cidadão estão já em condições de exercerem o seu direito ao voto tão logo sejam convocadas as eleições. Números que ultrapassar de longe, os sete milhões e meio inicialmente previstos e que consumiram grande esforço do governo.
Para tal, foram utilizados meios aéreos e marítimos para se atingirem as zonas de difícil acesso, exigindo do Governo um esforço suplementar em atenção as adversidades imprevistas.
E a Comissão Nacional Eleitoral já propôs ao presidente da Republica, final de Setembro de 2008 como data indicador para a realização das próximas eleições legislativas em Angola.
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O ano que se despediu viu o governo a aprovou um conjunto de programas de impacto socio-económico e investimentos.
O Governo assistiu este ano em dez províncias do, mais de um milhão e 100 mil famílias, no âmbito da sua estratégia de combate a pobreza.
Em 2007, o sector da energia apostou uma soma de dois biliões de dólares para recuperar a capacidade de produção e distribuição de energia eléctrica em todo país.
A aviação civil já tem uma nova lei, este ano o governo fez aprovar uma Lei que visa conformar o funcionamento interno com as normas internacionais de aviação civil.
No domínio financeiro o Governo e o Eximbank da China formalizaram este ano o segundo acordo para o financiamento de dois biliões de dólares.
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No domínio da reconstrução nacional, a reabilitação das principais estradas do país, como a via centro/sul que liga Caala a Benguela, a inauguração de Institutos de formação média por algumas cidades do país bem como a construção em tempo record de quatro pavilhões multiusos que albergaram os campeonatos africanos de nações em basquetebol e de clubes campeões africanos, nas cidades de Benguela, Huambo, Lubango e Cabinda.
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2007 continuou a ser um ano bem sucedido para a economia angolana . A equipa económica do governo continuou a trabalhar na contenção da inflação, o produto interno bruto continuou a crescer a dois dígitos e um grande desempenho da banca privada.
O sector petrolífero manteve a sua aura de grande abono da economia angolana e viu a entrada em produção de novos campos, o país passou a ter uma outra imagem juntos dos credores internacionais o inicio do pagamento dos atrasados juntos países que compõem o Clube de Paris.
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O ano que se apresta a findar será definitivamente marcado para a vida de alguns partidos políticos angolanos.
A FNLA um dos partidos históricos do nosso país viu cada vez mais distante a reconciliação interna. O partido sofreu um duro golpe morreu Holden Roberto, lendário chefe mas, os problemas no partido dos irmãos continuam bem vivos.
A Unita, o segundo partido mais representado na Assembleia Nacional renovou os seus órgãos internos no décimo congresso que também serviu para reeleger Isaías Samakuva, por mais um período de quatro anos afrente dos destinos do partido.
Samakuva derrotou copiosamente, nas urnas, o seu oponente Abel Chivukuvuku.
Em causas estavam dois projectos para o futuro da Unita. O projecto continuidade defendido por Isaías Samakuva e o projecto da modernidade do partido de Abel Chivukuvuku.
O MPLA terminou o ano com um discurso de crescimento das estruturas do partido mas, o seu presidente reconhecer que o partido precisa de trabalhar mais e, em 2008 o discurso do partido deve ser renovar o partido, dando oportunidade aos quadros mais capazes.
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O ano que terminou conheceu um dos julgamentos mais mediáticos da história do país.
O antigo director-geral dos Serviços de Inteligência Externa (SIE), Fernando Garcia Miala, julgado por crime de insurbordinação, ao abrigo da Lei militar foi condenado a quatro anos de prisão em regime fechado.
Pelo mesmo crime, foram também condenados a dois anos e seis meses de prisão, de prisão três antigos colaboradores do general Miala, os tenente-coronéis Miguel Francisco André, ex-director-geral adjunto, Maria da Conceição Domingos, ex-directora de contra inteligência externa, e Ferraz António, ex-director de estudos estratégicos dos SIE.
O julgamento orientado pelo Juiz presidente do Supremo Tribunal, general António dos Santos "Patónio", decorreu em 35 dias, durante 10 sessões, na sala da máxima instituição judicial militar.
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No domínio social, as cores do país ultrapassaram fronteiras entre vários responsáveis por esse feito destaca-se Micaela Reis, a miss angolana que conquistou o inédito segundo lugar no concurso da mulher mais bela do mundo.
Pelo país eventos como congresso de marcas notabilizaram no que se despede.
Ainda no sector social, 2007 foi marcado pelo surgimento de doenças desconhecidas que atormentaram a população das localidades de Cacuaco e Caxito.
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Mbanza-Congo, foi a capital da cultura angolana em 2007.
A antiga capital do reino do Congo foi palco do dia nacional da cultura comemorado logo no inicio do ano e acolheu a mesa redonda internacional sobre Mbnza-Congo, um encontro que discutiu ao mais alto nível o valor histórico do antigo centro de decisões de um dos mais poderosos reinos do continente, o reino do Congo.
Luanda recebeu um outro encontro de nível cientifico, que foi a 3º Encontro internacional de história de Angola.
O prémio nacional da cultura distinguiu os melhores de 2007 e o país viu o seu nome a ser escritos nos mais respeitados palcos internacionais.
2007 foi o ano da produção literária, de uma das maiores produções de discos.
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Pelo mundo foram muitos os acontecimentos que dominaram os noticiários internacionais. Em África o crescimento económico foi uma das notas mais significativas. Conflitos, acidentes de aviação, as tragédias humanitárias no leste do Congo Kinshasa e em Darful, marcaram um continente que exigiu da Europa uma nova parceria económica.
Em 2007, os franceses escolheram um novo presidente, na Argentina, a primeira dama virou presidente.
No médio oriente , George Bush juntou os líderes da autoridades palestina e do governo de Isreal, para a paz na terra Santa. 2007, viu desaparecer Ian Smith, antigo primeiro-ministro da Rodésia do Sul e Bob Denard, um mercenário francês tristemente célebre em África.
No Paquistão 2007 termina de forma sangrenta. A ex-primeira-ministra e dirigente da oposição paquistanesa Benazir Bhutto morreu na sequência de um atentado-suicida contra um seu comício em Rawalpindi que matou pelo menos 20 pessoas.
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Nunca o país viveu emoções tão fortes como em 2007. O basquetebol, o futebol e uma vez mais andebol foram as modalidades responsáveis por efeito.
O sonho tornou-se realidade pela primeira Angola escreveu o seu nome na galeria das melhores selecções do mundo que disputaram o campeonato do mundo em Andebol feminino.
No basquetebol sénior masculino Angola confirmou a hegemonia total no continente com a conquista de mais um titulo, o nono no geral.
No futebol, o Inter de Luanda conquistou pela primeira vez, na sua história, o titulo de campeão nacional, num dos campeonatos mais disputados de sempre .
As glórias no ano do desporto foi assim que vivemos 2007.

sábado, 29 de setembro de 2007

MALÁRIA, A INDÚSTRIA DA MORTE EM ANGOLA


Mais de 7 mil pessoas morreram como consequência de malária, em Angola, durante o ano de 2006.
A doença foi responsável por 30 por cento na taxa de mortalidade anual no país, sendo deste modo, a primeira causa da morte em Angola.
Só em 2006, Angola registrou cerca de 1,8 milhão de casos de malária, resultando na morte de 7,7 mil pessoas, um número considerado bem abaixo dos anos anteriores, quando a doença chegou a fazer anualmente 12.709 óbitos.Ainda assim, a doença continua sendo a principal causa de morte no país. O governo angolano acredita que a recente diminuição é consequência de um programa integrado do controle da doença baseado na introdução de um novo medicamento para o combate da doença, denominado Coartem.Para Milton Saraiva, director-adjunto do Programa Nacional de Luta Contra a Malária, está a ser implementado um programa integrado de controlo da doença que se baseia na introdução do novo medicamento com base na artimisinina, prevendo-se eficaz no combate à doença.De acordo com os dados de 2006, a província do Huambo no planalto central foi a mais afectada pela malária, com 443.215 casos e 1.412 mortos. Em seguida aparece Luanda, com 253.531 casos e 648 mortos.As acções como a distribuição de mosquiteiros impregnados de insecticida, pulverização intra e extra domiciliar, reforço do diagnóstico e o correcto manuseio de todos os casos sintomáticos tem ajudado na diminuição dos casos de malária.Para as autoridades sanitárias angolanas, os números oficiais de casos de malária em Angola, actualmente estimados em quase milhões por ano, deverão ser substancialmente reduzidos em 2007.
De acordo com Filomeno Fortes, o director nacional do Programa de Luta contra a malária, os casos da doença em Angola "não vão registar níveis alarmantes" este ano devido ao aumento da cobertura nacional de redes de mosquiteiros, mas também porque a estação das chuvas não foi tão intensa como em anos anteriores. A melhoria da qualidade do diagnóstico e tratamento da doença ao nível hospitalar também vai contribuir, segundo Filomeno Fortes, para reduzir os níveis de malária em Angola. "O objectivo nesta fase é evitar que a malária aumente", afirmou Filomeno Fortes, salientando que, ao nível da SADC, Angola apresenta actualmente "uma situação privilegiada em termos de controlo da doença". As mortes provocadas por malária em Angola diminuíram 39,4% em 2006, enquanto o número de casos caiu 31,3%.

A doença

A malária é uma doença às vezes fatal causada pelo vírus "Plasmodium falciparum" e afecta todos os anos entre 300 e 500 milhões de pessoas, principalmente nas zonas tropicais.A doença é a principal causa de mortalidade em crianças menores de cinco anos, que ainda não têm o sistema imunológico desenvolvido, além de provocar a morte de cerca de dez mil mulheres infectadas no período de gestação, em que perdem a imunidade diante do parasita.

Quadro Epidemiológico no continente

A malária coloca um grande desafio à saúde mundial. Anualmente, há pelo menos 300 milhões de novos casos de malária, um milhão de mortes causadas pela doença e mais dois milhões de mortes relacionadas com a mesma. A África subsariana é a região mais afectada, com 80% do total de casos e 90% das mortes por malária de crianças com menos de cinco anos.
A prevenção da doença passa pela distribuição de redes mosquiteiras, um método barato e eficaz porém, a assimetria entre meios urbanos e rurais e entre ricos e pobres é profunda: nas cidades há seis vezes mais hipóteses de usar redes mosquiteiras do que nas zonas rurais e, para os 20% mais ricos da população, essa probabilidade é 11 vezes superior a dos 20% mais pobres. Segundo o relatorio da ONU (Organização das Nações Unidas), apenas 5% das crianças com menos de cinco anos dormem com mosquiteiros nos paises da África subsariana.

Ajuda internacional

Para reduzir para metade os índices de prevalência da doença, o governo angolano disponibilizou este ano um orçamento de 5,5 milhões de dólares e contou também com uma doação de 15 milhões de dólares do governo norte-americano no âmbito da iniciativa do Presidente George W. Bush contra a malária na África.Em Fevereiro deste ano, o Ministério da Saúde de Angola recebeu uma doação de medicamentos no valor de 860 mil, composta por 580 mil conjuntos do medicamento Coartem.A Iniciativa Presidencial contra a Malária, IPM, criada pelo Presidente norte-americano, George W. Bush, conta distribuir este ano em Angola 450 mil mosquiteiros tratados com insecticida de longa duração e pulverizar cerca de bairros suburbanos nas províncias da Huíla, Cunene e Namibe, Cabinda, Lundas , Moxico Uíge e Zaire.
O programa contra o paludismo financiado por Washington foi lançado em Junho de 2005 com um orçamento de 1.200 milhões de dólares, para reduzir a metade a incidência desta doença num período de cinco anos.
Desde que foi posto em marcha já beneficiou seis milhões de africanos e espera-se que em 2007 chegue a outros trinta milhões de pessoas dos quinze países africanos mais afectados, nos quais a doença cobra por ano a vida de pelo menos um milhão de crianças menores de cinco anos.
Outra ajuda significante é do bilionário Bill Gates que sensibilizado com a morte de milhões de crianças em todo mundo disponibilizou 258,3 milhões de dólares para programas de combate à malária.
A Fundação Bill e Melinda Gates vai financiar num período de cinco anos, três projectos internacionais de combate a malária.
O dinheiro destina-se aos projectos da Liverpoll School of Hygiene and Tropical Medicine que visam estudar formas de controlo do mosquito que espalha a doença.
Outros projectos visam o desenvolvimento de novos remédios e insecticidas seguros para o meio ambiente.

Vacina

A medicina ainda não conseguiu dominar a doença os cientistas trabalham actualmente no desenvolvimento de uma vacina, eficaz, contra malária que poderá estar disponível em 2010.
A pesquisa sobre a vacina foi publicada no jornal de medicina Lancet e, segundo cientistas, é a mais promissora de muitas que estão a ser feitas.
A vacina foi experimentada a 2.022 crianças em Moçambique e reduziu em 58% a incidência da doença.
Ha seis anos, um outro de cientistas da Holanda, Tanzânia e Grã-Bretanha havia descoberto que um fungo nativo do leste da África poderia ser usado no combate à malária.
De acordo com os especialistas, quando o fungo infecta certos insectos, entre eles o mosquito transmissor da malária, ele cresce rapidamente e mata o animal.
Segundo ainda o mesmo estudo, o fungo diminui a expectativa de vida do mosquito em dois terços, para apenas sete dias.
Experiências feitas na Tanzânia, onde os cientistas cobriram 20% das superfícies em que os mosquitos "descansam" com lençóis contendo o fungo, levaram a uma queda de 76% de incidência da doença.

O combate a malária é o sexto objectivo do desenvolvimento do milenio, René Ernest, a coordenadora, na Alemanha, das metas do milénio mostrou-se céptica quanto a redução para cinquenta por cento ou a erradicação da malária em 2015 a atender pelos actuais indicadores da proliferação da doença.
Depende muito do que queremos atingir. Eu penso que neste momento não estamos a fazer um bom trabalho para travar a doença. Acho que poderíamos fazer melhor, com intervenções eficazes para travar o mosquito. O problema é que não temos vacina contra a a malária e assim é difícil combater”.
Para a oficial das nações unidas o número de países em que o mosquito da malária existe está a crescer e o próximo objectivo deveria ser travar a expansão da doença. A dúvida de acordo ainda com René Ernest é saber se essa meta será mesmo atingida em 2015. Os indicadores que são apresentados agora indiciam que não será possível combater a malária de imediato.

domingo, 23 de setembro de 2007

Entrevista com Jaka Jamba ( publicada no Diário de Notícia 25.04.1999)


FALHAMOS TODOS NA APLICAÇÃO DOS ACORDOS DE ALVOR

Almerido Jaka Jaca, é um dos históricos da UNITA, partido onde já ocupou várias posições de destaque. É formado em Filosofia, pela Universidade Clássica de Lisboa e foi por muito tempo professor das cadeiras de Filosofia e História no Liceu de Oeiras em Portugal.
Ingressou na UNITA em 1972, e dois anos depois, participou na preparação dos acordos de Alvor pelo seu movimento.
Por forças desses acordos ocupou pela UNITA a pasta de secretário de Estado da informação no governo de transição. A nível partidário já exerceu funções de secretário de educação, informação, dos Negócios Estrangeiros e da Cultura e Herança Africana.
Actualmente, com 50 anos de idade Jaka Jamba representa o galo negro no parlamento angolano.

P- 25 anos depois da assinatura do acordo de Alvor ,que avaliação se pode fazer?
JJ - 25 anos depois podemos dizer que se por um lado a independência formal é caso adquirido,
por outro há um longo percurso que deverá ser ainda cumprido para que a independência
corresponda as aspirações mais profundas de todos aqueles que de uma forma ou de outra, lutaram
para esse momento.

P - O que é que falta fazer?
JJ - No caso concreto de Angola há ainda algumas premissas básicas que ainda não foram adquiridas.
Uma dessas premissas é a criação de um contexto favorável para o aparecimento de instituições
supra apartidárias que tenham como objecto social a defesa e a preservação dos valores mais altos da
sociedade angolana.

P – Os acordos de Alvor não previam esse contexto?
JJ - As negociações que culminaram com os acordos de Alvor visam mais a marcação de uma data para
a independência de Angola, o fim da presença colonial portuguesa em Angola e isto foi um facto
adquirido a 11 de Novembro de 1975, mas a construção de um novo estado que permitisse um pleno
desenvolvimento de todos partidos políticos é ainda uma tarefa por se fazer.

P – Nas negociações não foi discutida Angola pós independência?
JJ - Nem todo o pacote da independência e do período pós independência poderia ser podia ser discutido
na mesma altura, mas, haviam aspectos que envolveram a potência colonizadora e outros países da
comunidade internacional, de qualquer a construção de uma nova nação era uma tarefa dos
angolanos os partidos políticos é que deveriam assumir essa responsabilidade. É verdade que houve um quadro concreto que foi o governo de transição multipartidário e rotativo. Esse governo tinha a responsabilidade de conduzir o país até a independência e depois tínhamos que encontrar formulas de conduzir o país.

P – Dentro deste quadro que está descrever , Portugal parece não ter tido nenhuma culpa no que sucedeu depois?
JJ – Houve no nosso caso concreto responsabilidades a vários os níveis. Portugal tinha as suas responsabilidades como potência colonizadora que era a agilização do processo de transição. A instabilidade política que se vivia em Portugal, resultante dos acontecimentos de 25 de Abril, tive muita influência em Angola, por outro lado, o contexto internacional em que se desenvolveu a luta pela independência de Angola pensou bastante. Foi um quadro da guerra fria em que as duas super potências tentavam tirar partido das suas influências, esta é a conjuntura que se desenvolveu o que fez com que houvesse uma grande luta de interesses em Angola no plano externo. Depois tem um outro elemento que é pouco referenciado nos debates: A responsabilidade e a capacidade dos próprios angolanos na construção de um estado novo e esta falta de concepção de bases mais sólidas degenerou no conflito que ainda hoje tem destruído o país.

P – Para além da fixação da data de independência o que é que os acordos de Alvor previam mais?
JJ - Também previam eleições, mas o grande problema que se levantou naquela altura, é que as escolas das elites políticas de então não concebiam um quadro de pluralismo de ideias . onde o vencedor podesse coabitar com outras partidos perdedores nas eleições esta para mim foi a principal fraqueza. Porque nós os angolanos poderíamos ser os pioneiros da democracia em África por sermos um dos um dos poucos, senão o único país africano que ao firmar a independência com a potência colonizadora reconheceu três movimentos de libertação representativos.

P.- Quem inviabilizou a realizações de eleições que estavam previstas nos acordos de Alvor?
JJ – No dia 1 de Janeiro de 1975 tinha sido formado o governo de transição composto pelos portugueses e pelos três movimentos, o MPLA,FNLA e a UNITA mas, a medida em que o calendário aproximava ao 11 de Novembro, gerou-se aqui em Luanda, um clima de instabilidade militar marcado por ataques as delegações e campanhas de diabolização entre os movimentos, o que impediu uma coabitação sã. Em Agosto do mesmo ano nós, a UNITA, tivemos que sair de Luanda porque a situação era insustentável e depois seguiu-se a FNLA em suma, não estavam criadas as condições para uma tolerância política que permitisse a realizações de eleições. O que se seguiu depois foi uma corrida contra o tempo de cada movimento afim de chegar ao 11 de Novembro como poder.

P – Esta situação teve uma mão de Portugal?
JJ – Os vários intervenientes no processo, incluindo o próprio Portugal tentaram ajudar o movimento que estivesse mais próximos dos seus interesses.

P – A UNITA sentiu também esse apoio?
JJ – Houve personalidades do governo português que tiveram muita influência, embora alguns mais tarde tivessem que sair. Por exemplo o Almirante Rosa Coutinho apoiava abertamente e claramente o MPLA.

P – A UNITA não teve apoio de alguém do governo Português de então?
JJ – Tudo quanto julgo saber não. Nós não tivemos nenhum apoio de personalidades do governo português, porque naquela altura a maior disputa centralizava- se a volta do MPLA e da FNLA. A acção da UNITA era a nível interno.

P – Vocês conheceram alguma acção de Portugal naquela altura e que podesse por causa a realização de eleições?
JJ – Talvez não seja muito oportuno citar-se nomes, mas houve manobras nos bastidores, sobretudo daqueles que tinham apostado no MPLA, no sentido de conduzir esse movimento ao poder. Houve ate missões como a Otelo de Carvalho um político e militar bastante influente em Portugal, que contactou Fidel de Castro afim de enviar tropas cubanas à Angola para salvarem o seu aliado, o MPLA. E isto está escrito nos arquivos e para aqueles que acompanhar o filme “África Vermelha” ouviram um depoimento do próprio general Otelo de Carvalho.

P – Em algum momento a UNITA sentiu-se marginalizada durante a discussão do acordo de Alvor?
JJ – Absolutamente, aliás a partir mesmo do momento em que se deu o golpe de estado em Portugal e com a eminência do fim do colonialismo em Angola, começaram a surgir a vários níveis manobras que visavam diabolizar uns e marginalizar outros e em Angola sentiu-se muito isso.

P- Quem falhou na aplicação dos acordos de Alvor?
JJ – Falhamos todos, os colonizadores porque não conseguiram assumir plenamente o seu papel e o seu compromisso diante da comunidade nacional e internacional e sobretudo porque não conseguiram conceber uma filosofia que permitisse a criação de um estado angolano com pluralismo de ideias .

Entrevista com Holden Roberto (publicada no Diário de Notícias 25.04.1999)



P – Como foram preparados os acordos de Alvor?
HR – Os acordos foram preparados primeiro como a cessação completa das hostilidades em Angola à 15 de Outubro depois de negociações com uma delegação portuguesa que se tinha deslocado para Kinshasa onde estava a direcção da FNLA. Só que naltura havia um outro problema, o MPLA estava dividido em três facções e necessário primeiro reconciliar o MPLA e depois encontrarmos uma plataforma conjunta de servisse de base de negociações com os portugueses. Mesmo assim nós a FNLA elaboramos um texto que com pequenas emendas foi o texto base dos acordos de Alvor.
A primeira discussão desse texto foi em Mombassa, Kenya, onde juntamo-nos os três movimentos a FNLA, MPLA e UNITA as linhas fortes da negociações com os portugueses.

P- Nesse encontro de Mombassa os outros movimentos haviam apresentado também propostas?
HR – Absolutamente nada, só limitamo-nos a discutir o nosso texto e praticamente não houve trabalho nenhum, porque a reunião serviu apenas para permitir a aprovação do texto por nós elaborado. Depois disso marcamos o encontro seguinte em Alvor

P – Qual foi o primeiro movimento a chegar a Portugal?
HR – Foi o MPLA e depois a UNITA. Nós partimos de Kinshasa para Portugal, num avião que nos tinha sido emprestado pelo presidente Mobutu. Chegados a Portugal, notamos que havia uma grande contra nós.

P – Quem fomentava essa campanha?
HR – A imprensa portuguesa , desde a Rádio, a Televisão até aos jornais, era uma campanha que metia medo.

P – O que é quê diziam da FNLA?
HR – Mostravam as imagens do acontecimentos de 15 de Março, éramos tratados de selvagens, analfabetos zairenses de quase todos os nomes possíveis. O curioso é que não havia nada contra a UNITA nem tão pouco o MPLA.
Nós acompanhamos toda aquela situação e pouco antes do inicio das negociações interpelamos os senhores Mário Soares então ministro dos negócios estrangeiros e Almeida Santos titular naltura da pasta da Administração do território, aquém manifestamos o nosso desagrado e a intenção de abandonarmos Portugal caso a propaganda hostil continuasse. A delegação portuguesa desculpou-se primeiro com as alegações de que em Portugal havia um pleno exercício da liberdade de imprensa, mas , mais tarde depois de consultas com o presidente da Republica, Marchal Gomes Costa, os ataques terminaram. Na sala de reuniões entretanto existiu um outro elemento que nos dividiu que era a presença do senhor Rosa Coutinho.
Nós havíamos rejeitado a presença dele nas negociações porque esse quando chegou a Angola como alto comissário, cometeu muitas atrocidades contra os nossos compatriotas e depois porque foi o primeiro prisioneiro de guerra que a FNLA tinha feito no inicio da luta armada e foi um pouco maltratado porque nós ainda não possuíamos uma experiência de coabitação com os prisioneiros de guerra. E ele poderia transportar para as negociações um sentimento de vingança, por esta razão pedimos a retirada dele.

P- Durante as negociações a FNLA em algum momento sentiu-se prejudicado em detrimento de outros movimentos, o MPLA e a UNITA?
HR – Era muito claro. Mas para nós o mais importante é que estávamos a conquistar a liberdade depois de 14 anos de luta.

P - O quê é que definiram os Acordos de Alvor?
H.R- Bom, Alvor definiu a formação de um Governo de Transição. Discutimos várias questões políticas, a tomada do poder pelos angolanos, a independência e os seus instrumentos e a marcação do 11 de Novembro de 1975 como data dessa independência. Tínhamos duas vertentes das negociações: a política e a económica. Quando concluímos as questões políticas nós, a FNLA, porque éramos os autores do Acordo de Alvor, levantámos a questão económica e a delegação portuguesa presente nas negociações exaltou-se: disse que não havia nada a discutir e que Portugal não devia nada à Angola. Antes pelo contrário, Angola é quem devia a Metrópole. Nós queríamos discutir a realidade da situação mas os portugueses não nos permitiram. Tenho em memória a reacção do senhor Melo Antunes, que foi uma reacção violenta, e como não tínhamos o apoio dos outros dois movimentos - MPLA e a UNITA - o assunto ficou enterrado e falamos apenas da independência.

P - Que discussão económica é que o FNLA queria ter com os portugueses?
H.R- Onde há entrega do poder há muita coisa a dizer. Portugal é que colonizou Angola e tinha a obrigação de revelar a situação económica do país que estava a deixar. Nós queríamos saber que acordos Portugal tinha com o exterior em relação a Angola, não podíamos receber o país sem conhecer as suas finanças, isso é natural e aconteceu com todos os países descolonizados. Acho que Angola é o único país que não abordou este problema.

P – Como é que o MPLA e a UNITA reagiram a vossa proposta?
HR - Não abriram a boca nenhum deles abriu a boca para dizer alguma coisa. E nós como estávamos no terreno do inimigo e depois os nossos parceiros não nos ajudaram preferimos encerrar o assunto. Mas s e estivemos num local neutro como Genebra que nós havíamos proposto antes , seriamos muito exigentes em relação a essa questão.
O que se passou é que as negociações decorreram um grande de intimidação. Basta ver que quando aterramos em Faro, encontramos o aeroporto fortemente cercado por tropas portuguesas e o mesmo cenário repetiu-se em Alvor , no hotel onde as delegações estavam hospedadas apesar, de também nós termos levado para Portugal homens armados, cento e cinquenta comandos muito armamento no avião
P - Evoluíram depois para o Governo de Transição. De que maneira é a FNLA entrou nele?
H.R- O Governo foi marcado pela distribuição das pastas ministeriais pelos três movimentos; depois discutimos o calendário das tarefas que nos iriam conduzir á independência nacional, preparar as eleições gerais, proporcionar o regresso dos refugiados espalhados pelos países vizinhos e, ao mesmo tempo, instalar as populações deslocadas. Os trabalhos começaram em Janeiro e a independência veio a ser proclamada 11 meses depois em Novembro, mas infelizmente em condições muito difíceis. Dois meses depois dos Acordos de Alvor iniciaram os confrontos militares em Luanda.

P - Quais foram os motivos do fracasso do Governo de Transição?

P- A desconfiança e a intriga da potência colonial, porque Portugal não facilitou a independência. Porque repare, houve uma intervenção das forças cubanas, quando Portugal ainda era soberano neste país, e o alto-comissário português para Angola, Leonel Cardoso ainda encontrava-se em Luanda. Ele deu a independência ao MPLA, quando os Acordos de Alvor tinham sido assinados pelos quatro - Portugal, FNLA, UNITA e o MPLA - mas ele retirou-se entregou o poder ao MPLA. Foi a mais greve violação dos Acordos subscritos em Alvor. Como se pode ver Portugal assume a maior responsabilidade por ter permitido a entrada de estrangeiros quando ainda era o poder. A partir desse momento a desconfiança generalizou-se, a guerra iniciou e esta guerra que dura até hoje.

P - A guerra iniciou aqui em Luanda, precisamente entre a FNLA e o MPLA, é assim?
H.R- Sim, começou aqui em Luanda, houve provocações que a história um dia vai se encarregar de revelar, porque há pormenores que necessitariam de muito espaço para serem contados. Posso dizer que essas provocações tinham sido bem planeadas, por exemplo para conduzir o processo da descolonização até ao dia 11 de Novembro. Os movimentos tinham aceite a presença de 26 mil homens da tropa portuguesa, mas quando se registaram os combates em Luanda essa tropa portuguesa participou nos ataques, contra a FNLA temos provas!

P - A tropa portuguesa combateu a favor de quem?
H.R- A favor do MPLA. Temos provas e despachos das agências que estavam aqui e publicaram isso. Essas tropas eram do Movimentos das Forças Armadas (MFA), e eram comunistas e esquerdistas, Alias já nos tinham alertado por amigos nossos, que as forças que se encontravam. em Luanda estavam misturadas com os comunistas e foram esses que ajudaram o MPLA.
Quando iniciaram os confrontos aqui em Luanda a FNLA estava a conquistar todos os quartéis do MPLA. Um dia a noite eu estava a trabalhar no meu escritório em Kinshasa recebo um telefonema por volta das duas horas da noite, do palácio do Belém
do marchal Costa Gomes a pedir-me um cessar fogo porque os combates em Luanda tinham feito muitos mortos e que os hospitais não tinham capacidade para receberem mais feridos segundo ele o Agostinho Neto é que tinha proposto o cessar fogo, e acrescentou caso nós não aceitássemos ele havia de ordenar as tropas portuguesas que se encontravam em Luanda para intervirem à favor do MPLA. Bem eu analisei a situação da nossa logística e resolvi na mesma noite telefonar para o presidente Mobutu que também disse-me ter recebido uma chamada de um embaixador americano que tinha feito a mesma sugestão. Mobutu convenceu-me a aceitar o cessar fogo e assim fizemos.
Foi nessa altura em o MPLA reorganizou-se para lançar outros ataques, que culminaram com a nossa retirada de Luanda.

P - O senhor está a falar numa conspiração que visava afastar a FNLA?
H.R- Isso já começou há muito tempo. Posso revelar um caso que acho interessante. Quando a delegação portuguesa chegou a Kinshasa depois das discussões que tivemos, estava-se prestes a assinar um acordo de paz, a delegação portuguesa disse-nos que Portugal aceitava a presença do MPLA e da UNITA em Luanda e nas províncias e a FNLA podia apenas abrir uma delegação em Luanda e mais nada. Perguntamos o porquê dos outros instalarem-se na capital e nas províncias e nós não? A única resposta que deram é que tinha sido uma decisão do Governo português. Então naquelas condições nós decidimos não assinar o cessar-fogo e as negociações ficaram suspensas por 24 horas, tempo que os portugueses precisavam para contactar o Presidente da República. No dia seguinte vieram dizer-nos que Portugal aceitava delegações da FNLA também nas províncias. Achamos aquela atitude muita estranha e sabíamos que alguma coisa havia de acontecer.

P - A FNLA negociou a sua saída de Luanda ou não?
H.R- Houve combates, a FNLA e a UNITA tiveram que sair de Luanda. Combates, aliás, que tiveram a intervenção das forças cubanas e de países africanos como o Congo-Brazaville, Moçambique, Guiné-Bissau, Argélia e os 26 mil soldados portugueses. Foi uma coligação de forças.

P - A FNLA também trouxe forças estrangeiras, ou não?
H.R- A guerra começou em Fevereiro, o primeiro soldado que nós fizemos prisioneiro era do Congo-Brazaville e mais tarde apanhamos guineenses,
Descobrimos que eram forças coligadas, e então pedimos ao Zaire que deu-nos três batalhões 1800 soldados. E em Maio de 1975 entrei com essas tropas em Angola, mas já havia uma coligação de forças estrangeiras que ajudavam o MPLA. Tenho cá por exemplo, um despacho da France-Press que falava no regresso das tropas da Guiné-Conacry depois dos combates em Angola. Temos documentos bem guardados.

P - As forças zairenses que entraram como senhor em Maio de 1975 tinham como objectivo impedir a proclamação da independência?
H.R- A data da independência já estava marcada, só que MPLA lançou a palavra de ordem "resistência popular generalizada", e queria tomar o poder pela força e era isso o que nós tentamos impedir. Mas como disse há bocado, as provocações estavam bem planeadas, porque Portugal fez muita luta para inviabilizar a realização das eleições gerais previstas nos acordos. Eu sofri muitas pressões mesmo em Alvor, no último dia das negociações fui chamado à parte pelos senhores Melo Antunes, Mário Soares, Almeida Santos e Víctor Alves para me dizerem que o povo angolano era muito atrasado para ir às eleições. O próprio Agostinho Neto também disse-me: “olha irmão, o militante da FNLA vai votar à favor da UNITA, do MPLA à favor da FNLA e assim haverá confusão”. Eles proponham uma ideia que achei uma ingerência nos nossos assuntos internos onde Portugal deveria definir Agostinho Neto como Presidente da República, com o controlo do Exército e das Relações Exteriores; eu iria controlar o resto do Governo, como primeiro-ministro e o Savimbi seria presidente da Assembleia Nacional. Os portugueses disseram-me que tinham já conversado com o Agostinho Neto e com Jonas Savimbi. Achei aquilo uma traição ao povo que tinha lutado para definir o seu próprio destino e neguei essa coisa de anular as eleições. Foi por isso que chamaram as forças estrangeiras para impedir as eleições, foi essa a história que se viveu naquela altura.

P - A UNITA também não queria as eleições ou era apenas o desejo do MPLA?
H.R- Eu não ouvi nada da UNITA, ouvi foi do MPLA. O Agostinho Neto conversou pessoalmente comigo depois os senhores Melo Antunes, Mário Soares, Almeida Santos e Víctor Alves chamaram-me de lado para me dizerem que a decisão que tinham tomado era de que não houvesse mais eleições em Angola. O povo, na opinião deles, não estava preparado, era atrasado e as eleições iriam significar uma confusão. Por isso é que eu digo: o que está acontecer hoje não é da responsabilidade do povo angolano, é sim da responsabilidade dos portugueses que não fizeram uma descolonização honesta.

Eleições e Eleitores

Depois do primeiro processo eleitoral, tido lugar no nosso País completamente traumatizante e frustrante, que defraudou todas as expectativas e esperanças do povo angolano, vão se aproximando a passos largos as segundas eleições legislativas e presidenciais em Angola.Se para alguns sectores, este processo é o renovar das esperanças e o sinónimo da consolidação da democracia em todo o País, para outros sectores principalmente para as zonas rurais e para aquelas províncias que sofreram de forma violenta, directa e dramática as consequências resultantes de um processo muito mal concebido, prevalece um sentimento de medo, insegurança, pessimismo, incredulidade em relação aos benefícios que este processo podetrazer para a vida de todos os cidadãos.Hoje por hoje, prevalece em muitos sectores a ideia de que eleições e guerra são palavras sinónimas.Como docente de Psicologia Social fui convidado por algumas pessoas conhecidas e amigas a fazer uma abordagem sobre esta temática a qual acedi com muito prazer.Influencia do ambiente Social no comportamento dos eleitores.A influência social inclui os sentimentos, qualidades relativas a força de vontade, concepções, ideias, interesses, pontos de vista e teorias que surgem inevitavelmente num determinado período histórico, dentro de grandes grupos sociais. A influência social quanto ao seu conteúdo é a reflexão psíquica ideal do ser social e em primeiro lugar das condições de vida material dos homens.A influência social tem uma estrutura complexa, nela se destacam diversas formas e níveis que estão em interligação e interacção que são os seguintes:A influência política, estética, ética, religiosa e filosófica. Porem estas formas fundem-se na consciência social real, pois, os grupos sociais de homens reflectem-se de forma directa na consciência social real, porquanto os grupos sociais reflectem os fenómenos sociais na íntegra.A influência comum em relação a influência social no comportamento dos eleitores, forma-se normalmente de um modo espontâneo enquanto a ideologia deve ser elaborada conscientemente. A formação espontânea da consciência, parte de diversos estímulos e motivos ou visam um determinado objectivo. Entretanto o comportamento dos eleitores é produto da actividade espiritual das pessoas que têm a consciência individual.Mas o que é a influencia social?De entre vários conceitos escolhemos um que achamos adequar-se mais a nossa realidade assim:Influência social é a modificação desencadeada, nos julgamentos, opiniões e atitudes de um indivíduo, pelo facto de tomar conhecimento de outrem sendo este facto visto pelos psicólogos sociais como um caso particular de interacção social.De que forma o ambiente social influencia no comportamento dos eleitores?A influência do ambiente social no comportamento dos eleitores explica-se igualmente pela existência de pressões sociais mais ou menos explicitas, para o compromisso social. A recusa ou transgressão conduz ao isolamento social, a marginalização e a aplicação de sanções.A unanimidade de opiniões dos eleitores também é um factor que favorece o comportamento fácil, promíscuo e propicia a inexistência de opiniões divergentes. As pessoas com um nível elevado de auto estima, tendem a manifestar independência nas suas opiniões e por isso escolhem ou votam em consciência. Pessoas com auto estima baixa, isto é com menos auto-confiança apresentam com mais frequência, comportamentos conformistas durante as eleições.Quando falamos de compromisso social, pretendemos referir a tendência que o indivíduo tem em se comportar segundo o que está socialmente estabelecido, face as condições objectivas do ambiente social.Teorias Sobre o comportamento eleitoralAs análises sobre o comportamento eleitoral, podem ser divididas em dois grandes grupos: um de matriz analítica macrossocial e outro microssocial, também conhecido como individualismo metodológico. Em ordem cronológica, a primeira perspectiva considera factores estruturais, culturais e históricos como formadores das esferas sociais, económicas e políticas de uma sociedade. Estes factores impem clivagens sociais que na esfera politica são representados por diferentes candidatos com os quais com os quais parcelas do eleitorado identificar-se-ia ou manifestaria o seu apoio ou oposição.Ainda nesta perspectiva, a analise marxista enfatiza a importância de determinantes económicas e da estrutura de classes como principais elementos de identificação entre líderes e liderados.Por outro lado, uma corrente marxista, chamou a atenção para a variedade cultural a partir da qual se formam as clivagens sociais. Para ela, o comportamento eleitoral deve ser explicado pelo ambiente sócio cultural em que vivem os eleitores e não simplesmente pela diferença entre classes sociais.A perspectiva macrossocial considera que grupos sociais distintos têm interesses diferentes e buscam uma representação política própria por meio de líderes que representam os interesses do grupo. Este seria o facto que faria o eleitor direccionar o seu voto para um ou outro candidato ou também pelo não voto. Assim, a influência do grupo é um importante elemento explicativo da escolha eleitoral, pois, pessoas que trabalham e vivem juntas tendem a votar nos mesmos candidatos. De acordo com esta perspectiva, ganham importância os elementos psicossociais para a determinação do voto e aparece como figura relevante a figura do líder de opinião. O líder de opinião de determinado grupo social consegue comunicar-se com os seus iguais influenciando na tomada de decisão do voto. Ele possui uma posição central no grupo a que pertence e isto garante-lhe melhores condições de recepção das informações e difusão de opiniões.Esta abordagem psicossocial na corrente macrossocial permite um avanço na teoria; até então era incapaz de explicar a variações de comportamento eleitoral dentro dos grupos sociais, essas variações de comportamento são explicadas pelo surgimento ou substituição de líderes de opinião. Alem disso a corrente psicossociologia considera como elementos determinantes do comportamento eleitoral, percepções do próprio processo, tais como a identificação do candidato vencedor, o sentimento de obrigação de votar em uma disputa e outros mais. Sendo assim, alem das clivagens das clivagens histórica, social e cultural dos grupos, os indivíduos apresentariam subclivagens de comportamento eleitoral, dado que o comportamento final dependeria de seus graus de interesse e informação a respeito das eleições.A perspectiva microssocial abordada por Antony Downs nos finais de 1950 refere que seria possível explicar os comportamentos políticos considerando que os indivíduos são racionais e agem intencionalmente, procurando maximizar os seus ganhos, tal como fazem os consumidores no mercado económico. Sendo assim, os efeitos do grupo seriam secundários na definição do comportamento eleitoral, mas não rejeitados. De acordo com esta corrente, o eleitor toma duas decisões relacionadas entre si:1- Participar ou não no processo eleitoral2- Escolher determinado partido ou candidato – sempre considerando que adecisão tomada seria
a melhor para ampliar os seus ganhos individuais.Downs, chama também atenção para o facto de que a ideologia pode ser considerada um factor simplificador do universo político, uma vez que teria principalmente, um carácter instrumental, facilitador do processo da tomada de decisão como uma espécie de atalho.Uma vez que contribui para a caracterização dos partidos, a ideologia é um dos meios para obterem-se votos. Do ponto de vista dos eleitores, ela passa a ser um recurso económico que diminui os custos de procurar informações a respeito dos partidos e dos candidatos, ou seja. Esta teoria apresenta um carácter microssocial até mesmo para fenómenos considerados predominantemente macrossociais, como é a situação da ideologia.Parece claro que as diferentes correntes apresentam explicações incompletas para o comportamento eleitoral contemporâneo, na medida em que o eleitor é encarado como um sujeito que decide racionalmente em quem votar, mesmo que essa escolha seja condicionada pelo contesto em que este se insere. Como todo o voto é uma acção intencional, logo racional, trata-se de uma acção voltada para alcançar de forma mais eficaz os objectivos pretendidos por cada eleitor. O importante é não esquecer que os actores políticos agem em situações estruturais e institucionais específicas.Estas situações condicionam a suas opiniões, atitudes seus objectivos e os instrumentos de que dispõem para perseguirem os seus objectivos. Por isso, análises recentes levam em conta por um lado factores sócio-económicos e demográficos, além dos politico-institucionais e por outro, a dimensão subjectiva e cognitiva do eleitor.Há varias formas de abordagem do comportamento eleitoral, de maneira directa ou indirecta. Ainda assim, apesar dos avanços nas teorias é comum encontrar na literatura, tratando de maneira não central a ideia de que o eleitor tem efectivamente uma opinião politica que gera um comportamento eleitoral que pode ser mutável ou volátil, seja quando movido pela busca da maximização dos seus ganhos pessoais seja quando movido em função de constrangimentos dogrupo social a que pertence, este comportamento e as opiniões são constantemente cambiáveis. Não se deve acreditar na existência de eleitor maioritário que apresente um comportamento eleitoral estruturado rigidamente de maneira que seja constante e totalmente previsível.Opinião Pública e Volatilidade EleitoralEm sociedade, as pessoas sempre procuram opiniões coerentes com as opiniões gerais do grupo a que pertencem. Para isso seleccionam informação e mensagens que recebem prestando atenção aquilo com que concordam e privando-se do que as desagrada.Ao desprezar mensagens contrárias as atitudes do grupo, os homens vêm estas mesmas atitudes nos companheiros que exibem tendências colectivas similares.Isso não significa que todos recebem e processam exactamente a mesma quantidade ou tipo de informação, ou que sejam influenciados pelos mesmos aspectos da vida social.Cada pessoa tem o seu conjunto particular de experiências e o seu próprio grupo de dados mesmo seleccionando e julgando o social de acordo com padrões gerais comuns. É fundamental estudar em que condições as atitudes geradas pela dinâmica de grupo se modificam. Influencias regionais ou de realidade próximas podem gerar um padrão comportamental que determinará um maior ou menor grau na decisão do voto. Por isso é válido estudar os resultados eleitorais a partir de recortes geográficos.É preciso considerar, de maneira complementar que os homens nas sociedades modernas não pertencem a um único grupo, existem posicionamentos anteriores e de largo aspecto como classe social, cultural e padrões que decorrem da faixa etária ou da região, grau de participação na comunidade, como local de trabalho e família onde o processo de socialização é fruto de influências mútuas entre os elementos do grupo.Outro factor interveniente no comportamento eleitoral volátil é a já citada figura do líder de opinião. Dentro dos grupos não há uma homogeneidade de participação politica entre as pessoas. Sempre existem aqueles que são mais activos e capazes de expressar-se, normalmente mais sensíveis aos interesses do grupo e mais ansiosos de se manifestarem em momentos importantes. Uma das funções destes líderes é a medição entre os meios de comunicação e os demais componentes do grupo, pois sabe-se a mais de meio século que os efeitos dos meios de comunicação social não são iguais em todos os integrantes de determinado grupo.Alem do líder de opinião, outro factor indispensável para a análise do comportamento eleitoral volátil tem sido o efeito da mídia na política. As novas características dos processos eleitorais inseridos no sistema de comunicação de massas são identificados como “democracia de público” de acordo com a metáfora de Bernard Manin (1995).Segundo a teoria da escolha racional, considera-se que a decisão do voto é produto da acção racional individual e orientada por cálculos de interesses pessoais. Tendo em vista o objectivo de maximização de ganhos, o eleitor decide em quem votar a partir da análise dos benefícios que se podem obter no caso de vitória do candidato desejado. De acordo com esta teoria, o eleitor em função dos seus interesses é capaz de seleccionar partidos e candidatos em ordem de preferência e optar por aquele que lhe possibilita a obtenção de maiores ganhos.ConcluindoTal como vimos no início a influencia comum forma-se normalmente de um modo espontâneo. Porem o ambiente quotidiano elabora os pontos de vista e determina os objectivos. A psicologia social ensina-nos que a influencia do ambiente sobre o comportamento dos eleitores por meio da agitação, propaganda, dos sentimentos de solidariedade de classes amizade ou de hostilidade, de interaccionismo ou nacionalismo simpatia de status ilusões, convicções, ideais, vontade e ainda por indução psicológica.A influência do ambiente social no comportamento dos eleitores aplica-se igualmente a partir da consciência jurídica, moral, ética e estética.Referências Bibliográficas:• Krapirine,v- Fundamentos metodológicos e métodos de estudo da Filosofia Edição Progresso, 1986.• Braga da Cruz, M - Teorias sociológicas ( os fundadores e os clássicos)• Alain Cerclé/Alain Somat- Manual de Psicologia Social (Epigenese, desenvolvimento
e Psicologia).• Gleitman, Flenry- Psicologia, Norton& Company, in New York• Rodrigues, aroldo/ Asmar, eveline maria leal/ Jablonski, bernardo, Psicologia Social 22ª edição editora vozes Petrópolis 2003.

ESTRANHO INTERESSE PELA SEGUNDA VOLTA

O súbito interesse manifestado quer pelo presidente José Eduardo dos Santos quer pelo seu partido MPLA em clarificar a segunda volta das eleições presidenciais de 1992, introduziu um novo elemento de discussão no “pacato” cenário politico angolano, onde os seus agentes, em particular os partidos políticos, são quase invariavelmente convidados formalmente, pelo “dono da festa”, a participarem neste ou naquele assunto da conveniência de quem organiza a “ sentada”.
Para uns falar-se hoje da segunda volta de eleições presidenciais realizadas em 1992 é algo sem sentido, aquilo que Nelson Pestana chamou de “non sense” porque a razão de ser de uma segunda volta de tem haver com o apuramento da vontade do eleitorado para um determinado mandato que iria de 1992 a 1997. Esse mandato foi cumprido pelo presidente José Eduardo dos Santos que tendo sido o candidato mais votado em 1992 sendo que também o candidato que já era presidente da primeira Republica, não fazendo por isso sentido ir perguntar a um eleitorado que se modificou profundamente, qual era o sentido preciso da sua escolha em relação as eleições de 1992. Por isso o preceito legal que fala de uma segunda volta das eleições presidenciais, quando um dos candidatos não obtém a maioria absoluta, tem haver com o apuramento da vontade de um determinado corpo eleitoral historicamente determinado e, para um determinado mandato.
O facto do corpo social do eleitorado de 1992 não ser o mesmo e o facto de que esse apuramento de vontades tinha haver com a possibilidade de uma segunda escolha daqueles que não tinham votado nos dois candidatos mais votados em 1992 ou seja José Eduardo dos Santos e Jonas Savimbi.
Por outro lado, a realização de uma segunda volta não teria a utilidade pratica porque José Eduardo dos Santos já cumpriu o mandato de 1992 a 1997 a que se respeitava essa eleição, assim parece não existir qualquer sentido na necessidade realização de uma segunda volta ao menos que sirva única e exclusivamente os interesses não declarados dos candidatos no caso José Eduardo dos Santos e Alberto Neto.
É verdade também que muitos questionarão que o facto de o presidente José Eduardo dos Santos não ter prestado o juramente perante o Tribunal Supremo tal como prevê o artigo 62, ponto 3 da Lei Constitucional da Republica de Angola, terá criado uma situação que ainda o coloca como presidente da Republica Popular de Angola. Assim sendo referem as mesmas correntes de opiniões onde se insere Alberto Neto, a Republica de Angola ou seja a segunda Republica, não teve ou não tem presidente.
Dentro desse quadro competiria ao Tribunal Supremo, pronunciar-se ouvido os dois candidatos em condições de disputar a segunda volta das eleições presidenciais, José Eduardo dos Santos (obteve 49,57% de votos em 1992) e Alberto Neto (2,16%), este último o terceiro classificado em 1992, ocupando a vaga deixada pelo falecido Jonas Savimbi, o segundo classificado da primeira volta com 40,07 % de votos.
Tal como escreveu Nelson Pestana “ Bonavena” no seu artigo “Non sense da segunda volta” a questão não é uma questão política ou legislativa, nem tão pouco de contencioso eleitoral mas uma questão constitucional. Cabe ao Tribunal Constitucional resolvê-la ao ser suscitada perante ele. Mas será uma causa recusada, seguramente, por falta de objecto e extra temporalidade. Não pode haver segunda volta, não porque Savimbi morreu, não porque Alberto Neto foi pouco votado e não foi o segundo colocado mas, porque decorridos 12-13 anos nenhum dos candidatos da primeira volta das eleições de 1992 tem agora legitimidade para se apresentar a uma segunda volta, porque é uma reivindicação de realização impossível pois mesmo que se apure entre os dois candidatos qual deles deveria ter exercido o poder entre 1992 e 1997, não se poderá reparar, se for caso disso, na medida em que o cargo já foi exercido por José Eduardo dos Santos. Que não só exerceu esse mandato como um segundo entre 1997 e 2002 e, até entrou no seu terceiro e último mandato que termina em 2007.
Aliás os Tribunal Supremo já dispõem de um requerimento de Alberto Neto a reclamar a conclusão da segunda volta aguardando que o José Eduardo dos Santos faça o mesmo.
Mas a questão que se coloca é que os actos praticados por Eduardo dos Santos durante os últimos 13 anos o vinculam como presidente da Republica tendo ele, feito ou não o juramento à nação conforme prevê a Lei Constitucional vigente em Angola.
Haverá um interesse político quer de José Eduardo dos Santos quer de Alberto Neto na realização da segunda volta mas, esse interesse é meramente pessoal. A questão que se coloca agora é perguntar ao corpo politico no país, se quer uma segunda volta ou quer uma eleição presidencial a seu devido tempo, porque ninguém pode negar, por interesses pessoais, o direitos de cidadania a todos aqueles cidadãos que agora atingiram 18 anos de idades e por isso em condições de responder quem os deve governar.
Apesar de existirem interesses pessoas dos dois candidatos, subjacentes na necessidade da realização dessa segunda volta das eleições, o principal problema parece assentar sobre a limitação do tempo de mandato. JES estará a terminar no próximo ano o seu terceiro mandato e último mandato e por isso nunca mais se apresentará como candidato.
JES é de facto o presidente constitucional da segunda Republica ele próprio já o afirmou em variadíssimas ocasiões e o Tribunal Supremo também fê-lo a partir do momento em que o considerou chefe do executivo. E a palavra mandato, dentro da economia da Lei constitucional não quer dizer apenas o exercício de um poder dentro de determinados limites, depois de um juramento formal. A própria Lei de revisão considera mandato ao poder exercido por JES na primeira Republica. Ou seja, o constitucionalista angolano não entende mandato apenas aquele que é dado de forma legítima. Mesmo, aquele que é ferido de legitimidade desde que seja o exercício do poder ou o cargo é entendido como cumprimento de mandato.
Nas condições em que JES governou o país cumpriu efectivamente mandatos e para o ano, em 2006, cumprirá o terceiro mandato consecutivo e a luz do artigo 59 da Lei Constitucional, que diz “ O mandato do Presidente da Republica tem uma duração de cinco anos e termina com a tomada de posse do novo Presidente eleito. O Presidente da Republica pode ser reeleito para mais dois mandatos consecutivos ou interpolados”. Perante o rácio deste artigo, nenhum angolano deverá exercer o cargo de presidente da Republica para lá dos 15 anos. E se isto é válido para um angolano legitimamente eleito, por maioria de razão, também é válido para um angolano ilegitimamente eleito.
É que entre a norma que diz que o Presidente da República deve ser eleito de cinco em cinco anos e a que determina a necessidade de uma segunda volta para um melhor apuramento da vontade do corpo político nacional, a primeira prevalece. E, tanto é assim que há países democráticos que não tem este mecanismo acessório da segunda volta, elegendo o Presidente da República por maioria relativa. Deste modo, JES estará claramente impedido de se recandidatar para mais um mandato daí também o seu interesse pessoal na clarificação da segunda volta de eleições presidenciais interrompida em 1992. E pergunta que se faz é tão simples quanto essa. Os angolanos deverão aceitar que haja uma nova eleição do presidente JES que está a terminar os 15 anos que a Lei constitucional lhe permitiu no exercício do poder ou vamos fazer uma revisão implícita da Lei tornando o poder vitalício que vai contra todo o espírito da segunda Republica que se define como estado de direito democrático por isso não aceita o poder vitalício?